A felicidade está nos bastidores, não no palco

Quando eu tinha 15 anos, resolvi fazer teatro. Foi um ato de rebeldia contra os meus pais, que achavam aquele lugar um antro. Mas eu insisti, porque eu queria ser atriz - e talvez eu ainda queira, enfim, sonhos zumbis, os quais não sei se estão mais vivos ou mais mortos. Então, eu permaneci nos palcos por alguns anos. Saí, voltei, saí e não voltei mais. Já fui adolescente na adolescência, já fui mãe sem ter filhos, já fui madame sem ser rica, já fui até presa sem ter cometido nenhum crime. E essa é a magia que a atuação não divide com nenhuma outra arte: a de doar uma parte de você para criar um personagem que não faz parte de você. O que eu mais gostava era a sensação de estar no palco, ainda que com calafrios de nervoso e mãos trêmulas, porque eu queria ser vista fazendo algo incrível. Isso é o que eu mais sinto falta do teatro. O palco. E eu tentei tanto, desde que saí dos palcos do teatro, estar nos palcos da vida, até descobrir que para certos tipos de atuação, não existem palcos, apenas bastidores. 

Sabe quando você faz um jantar super delicioso, com direito a 3 horas de preparo e ingredientes selecionados que te demandou uma logística complexa para encontrá-los mas, com o resultado, tudo o que você tem dos seus convidados é um "muito bom, parabéns". Isso quando não é só você, sem receber qualquer elogio pelo seu empenho e sacrifício. Ou então quando no seu trabalho você se destaca por um feito que te levou a um desgaste físico e mental e seu superior apenas dá uma batidinha nas suas costas. Horas e horas de esforço para um instante de vitória. E eu sei, no entanto, que esse é o mundo em que vivemos, as pessoas com quem lidamos e apenas a nós cabem as nossas frustrações mimadas de falta de reconhecimento. Queríamos estar no palco, sendo aplaudidos, com rosas caindo sobre nossos pés a cada palavra. Porque decoramos aquele texto, nós dedicamos tempo e abrimos mão de outros agrados para estar ali, mostrando o resultado do nosso suor. Mas tudo o que recebemos é uma plateia pouco entusiasmada, com mais cadeiras sobrando do que preenchidas e quase nenhum aplauso.

Caso você não tenha percebido, a nossa vida acontece mais nos bastidores. Já pensou o quanto nos desgastamos nos bastidores e, pior, o negligenciamos só porque ninguém nos vê? Estar nos bastidores, na verdade, é um monólogo, onde você se apresenta e você se aplaude. A vida acontece bem mais nos bastidores do que nos palcos, e somos nós mesmos quem precisa ser artista e espectador ao mesmo tempo. Não dá para esperar o palco, a plateia e os elogios. Temos que fazer isso por nós mesmos. Temos que nos elogiar pelo jantar super delicioso e pelo feito no trabalho. Afinal, o que se vive por trás das cortinas é o essencial, o íntimo, o amargo adoçado da vida. É a rotina que você não abre mão, é o prazer de correr por mais de 10 minutos sem doer a panturrilha, é terminar um artigo que você postergou por meses. Nos palcos, a gente se veste, se maquia e se coloca no melhor ângulo. É o que queremos que os outros vejam. Com isso, começo a questionar se não é nos bastidores onde a felicidade mora, com pouca atenção chamada pra si, como um acessório empoeirado pouco usado nas peças e que ninguém nota sua presença em cena. 


Comentários

Mias populares