Páscoa, Natal, Deus e o Mercado



Quando ainda era criança, a afirmação de um padre no sermão de uma missa qualquer nunca saiu de minha mente: “A Páscoa é muito mais importante que o Natal!”. O padre dizia isso pois sabia que boa parte da gente comemora o Natal com muito mais intensidade que a Páscoa, em todos os sentidos, e essa contradição chamou minha atenção. Eu não era uma criança necessariamente crente, mas era curiosa. Resolvi ir então a alguns dados: Antes da Páscoa existe um período de quarenta dias de preparação, privações e reflexões, chamado de Quaresma. Além disso, na semana que antecede o tal feriado, tudo isso se intensifica, na chamada Semana Santa. No Natal, não tem nada disso.
Então concluí que a Páscoa é sim mais importante que o Natal, pelo menos do ponto de vista religioso. Mas por que então o Natal tem mais publicidade na mídia? Por que existem mais musiquinhas de Natal do que de Páscoa? Por que o clima nas famílias e nas ruas se torna mais “fraterno” em tempos de Natal do que de Páscoa? Justifico com uma palavra: Mercado.
Convencionou-se no que no tempo que representa o nascimento de Jesus Cristo as pessoas se presenteiam, se unem, ceiam e etc. Presentes, transporte e ceias custam dinheiro, e dinheiro movimenta a economia. Além disso, deslocou-se esta data para um dia próximo ao Reveillon, tempo de festa, unindo o útil ao agradável: Festa, presente, ceia e mais uma semana de ressaca (Já que, na Bíblia, o livro que orienta a fé cristã, não está escrito que Jesus teria nascido ao dia 25 de dezembro, exatamente).
A Páscoa também não se salvou do mercado: o costume de alguns povos tradicionais de enfeitar ovos para presentear e/ou brincar com as crianças nessa época foi transformada: Ovos de chocolate que são vendidos a preços salgados, explorando a grande demanda. Vamos refletir: O chocolate não tem sequer 500 anos de existência, enquanto que a festa pascoal é anterior ao próprio Cristo.
Se o deus dos cristãos fosse um ser humano, ele provavelmente seria um homem ultraliberal, que acredita na regulação do mercado sem intervenções (traduzindo-se agora “mercado” como “humanidade”), e nessa política não-intervencionista(livre arbítrio), o homem deturpou o significado do nascimento e do sacrifício de Jesus Cristo segundo os preceitos do capitalismo.
No intuito de provarmos como a Páscoa pode ser considerada mais importante que o Natal, basta comparar toscamente a história de Cristo a uma obra da literatura romântica: O Natal equivale ao começo, os primeiros capítulos. A Sexta-feira Santa, onde morre o protagonista, seria o clímax, e a Páscoa seria o “felizes para sempre”. Há ainda, segundo pregam os cristãos, a possibilidade dessa história não ter acabado, e o grande Messias retornar. Imagine, caro leitor, que engraçado seria se isso realmente acontecesse?
Você, que está longe do grande acontecimento, vendo novela, teria sua programação interrompida pelo Plantão da Globo: “Tanãnãnãnãnã – Acaba de voltar à Terra o filho de Deus, Jesus Cristo”. Enquanto isso, gritos de alegria ecoariam pelas ruas, e outros brados de “Chupa ateu!”, também seriam ouvidos.
Mas voltando ao tema, analisemos: O que a constatação da superioridade da Páscoa muda em nossas vidas? Absolutamente nada. Mas serve como reflexão para os cristãos avaliarem se estão comemorando estes acontecimentos de maneira honesta com sua doutrina e consciência. Se você não for cristão, tente apenas imaginar o Plantão da Globo – Especial Jesus. Se você der risada como eu, já valeu.
 

 

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