Por um sexo despudorado - e com mais orgasmos
Mariam Sitchinava
A gente cresce com os olhos fechados para qualquer malícia, qualquer conteúdo explícito, qualquer demonstração de afeto íntimo. Sexo na infância é tabu, a mamãe encomendou você de uma cegonha ou plantou uma semente na barriga, as genitais são intocáveis e você não deve abrir a boca para falar sobre essas "obscenidades". Até porque você, àquela altura da vida, sem muita altura, não sabia nada a respeito. Não era assunto de pauta em mesa de jantar da família, não era visto na televisão e nem ensinado na escola. Era como se sexo não existisse. Mas você cresceu, eu também, e sabemos que, com o tempo e as vivências, um dia a gente descobre.
Para os meninos púberes era discurso de orgulho o de se masturbar diariamente, já para as meninas, tocar a própria vagina bastava para ter nojo de si mesmas - e se isso viesse a público, era humilhante. A mesma iniquidade vale para o sexo: meninos sexualmente mais ativos eram vangloriados enquanto as meninas eram promíscuas. Passada a adolescência, a gente felizmente entende que não é assim. Ou que, pelo menos, não deveria ser. Ganhamos a liberdade para dentro da cabeça, fazemos o que bem queremos e tocamos o foda-se. Mas o significado do sexo continua o mesmo. O cara tira a roupa, a mulher tira a roupa, mão na bunda, beijo no pescoço e, finalmente ou somente, a penetração. Além disso, o coito termina quando o cara chega lá. Aonde é esse "lá" que as mulheres nem sempre chegam? Censura. Mulher sente menos prazer do que homens, muitos dizem. Sentem muito mais quando bem estimuladas, eu afirmo. E, nessa maré de ignorância em relação ao sexo, a gente acha que ele só acontece quando tem penetração. É por isso que tem marmanjo que diz que a transa de duas mulheres é um mito. É por isso que há a necessidade da pergunta inconveniente e heteronormativa de quem é ativo e quem é passivo nas relações homossexuais. É por isso que tem muito sexo terminando sem ter acabado, sem ter sido incrivelmente gostoso, sem ter chegado no auge. Porque, meus amigos, penetração não é tudo o que define sexo.
A gente talvez pudesse aproveitar muito mais cada detalhe do sexo se lá trás fosse-nos explicado mais o que era, se não fosse tão censurado quanto mídia em tempos de ditadura militar. Talvez não tivéssemos tanta vergonha da nossa própria natureza e das diversas e diferentes maneiras de desfrutá-la. E, por fim, talvez teríamos mais consciência e conhecimento no que diz respeito às doenças e à gravidez. Tanta coisa poderia ser evitada e tantas outras poderiam ser mostradas.
Sexo vai além de um entra e sai. Sexo nem precisa disso. Sabe quando no beijo a gente já sente vontade de se desfazer das roupas, as pegadas ficam intensas, as mão inquietas, a boca desce, o cabelo bagunça, a pele arrepia e as unhas arranham? O corpo todo se envolve. Isso é sexo. É essa entrega que não permite retração ou interrupção. É essa troca de fluídos e experiência que não permite metades ou pausas. E, para ser sensacional, tem que ter química e tem que ter orgasmo. Por um sexo despudorado, eu convido você a se entregar, não à pessoa, mas à transa. Ou aos dois, o que é ainda melhor.
- Mariana Sanches Moraes
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