Rugas
Estávamos no restaurante conversando sobre qualquer coisa que levou a minha mãe a falar das suas rugas. Ela levantava a bolsa de olheira com os dedos, mostrando como ela gostaria que fosse e, delicadamente, tirava as mãos do rosto. Cada linha da marca que os anos deixaram foi se recompondo devagar debaixo de seus olhos, como se levasse o mesmo tempo de se refazer que o de surgir. Devagar, mas de repente. A pele flácida a incomodava, as estrias de uma gravidez a desanimava e o cansaço a colocava no sofá por mais horas que os filmes franceses. Mas, por alguma razão qualquer, ela resolveu desabafar sobre o envelhecimento acompanhada de meia luz, vinho e pizza. Ela resolveu expor para o meu pai e eu o quão dissolvida se sentia pelo tempo.
Eu olhei para a minha mãe enquanto ela reclamava, olhei para o meu pai e concluí que eu não concordava com aquela história de cirurgia e não aceitação das rugas de que minha mãe falava. Tentei explicar que faz parte da vida e não adiantou. Então, eu disse que ela ainda era nova, que não deveria se preocupar e isso também não adiantou. Ela parecia estar aos prantos por dentro há muito mais tempo antes de nos contar. O assunto acabou e, como se nunca tivesse existido, jantamos e fomos para casa. Mas aquilo me deixou absorta. Quis entender a minha mãe e, acima disso, quis convencê-la de que a velhice, a qual ela se referia como sendo as rugas, havia de chegar e que deveria ser bem recebida. Que linhas de expressões são apenas um pedacinho de tecido do retalho imenso que é envelhecer. A juventude também é uma maneira de definhar. Há pessoas velhas jovens e adolescentes que são idosos. Porque a velhice, a verdadeira e original, vem de dentro para fora. Ela nasce na alma. E é dela que temos que ter medo.
Rugas, e somente, não podem te tornar velho. Mas, se com elas, vier o desespero de estar envelhecendo, então você caduca. A aparência desgastada não é beleza desgastada. E eu queria tanto dizer isso a ela, minha mãe. Queria dizer que cirurgia nenhuma vai trazer sua juventude outra vez senão aquela superficial, porque para um rejuvenescimento de verdade a alma não pode ser ranzinza. Eu queria que ela visse as rugas como pinceladas do tempo e que ela é uma obra de arte. Que sua bolsa de olheira carrega uma sabedoria que não caberia debaixo dos olhos da menina que ela fora há 20 anos. Eu queria. Mas vou deixar que a pele fique cada dia mais fina em seu corpo e os fios do cabelo cada dia mais brancos, para que ela não se esqueça de que as lições da vida só o tempo pode dar.
- Mariana Sanches Moraes
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