Numa tarde dessas de pôr do sol roubando os olhares, eu estava sentava na varanda da casa da minha tia, com o corpo mole e pernas esticadas, ouvindo a conversas das tias e da minha mãe. Elas falavam sobre uma senhora que teve que levar uma caixa de ferramentas pesada para o rapaz que consertou a porta do guarda roupa de sua casa, pois ele havia esquecido lá. O cara passou o endereço para ela entregá-lo em vez de ir buscar a caixa, condenavam minhas tias e minha mãe. A senhora, segundo elas, estava com problema na coluna e sentia fortes dores nas pernas e braços. Mas ela foi. Ela foi e entregou a caixa de ferramentas ao homem que, partindo de um bom senso, deveria ter ido pegá-la. Mesmo em sua condição de pessoa idosa, cansada e indisposta, ela seguiu a instrução do cara e levou até ele o que precisava. Mas e se ele não estivesse em casa? E se ele tivesse passado o endereço errado? E se fosse um rapaz de má índole e a velhinha estivesse sido pega de surpresa em uma emboscada? E quem, afinal, pensaria nessas hipóteses? Poderia acontecer. Só que ela decidiu confiar. Confiou que o moço estaria em casa, que era o endereço correto e que ele era uma boa pessoa. Se é ok confiar em alguém a ponto de levar a essa pessoa uma caixa pesada, com dor na coluna, pernas e braços, por que às vezes é tão difícil confiar em um não estranho?

A confiança poderia ser mais uma daquelas palavras raras de se conhecer com propriedade, que só quem tem ousadia de domá-la poderia se intitular confiante. Fazem isso com o amor. Engrandecem algo que, embora nobre, não nasce apenas dos grandes gestos e palavras de beleza infindável. É aquele conto parnasiano que diz que se trata dos detalhes, das pequenezas. Porque confiar é algo muito corriqueiro. Para viajar na estrada, é preciso confiar no caminhoneiro que dá sinal para ultrapassagem numa curva acentuada. Para trabalhar em uma empresa, é preciso confiar nos colaboradores que estão no mesmo processo que você para que no fim tudo dê certo. Para encontrar com alguém, é preciso confiar na pessoa quando ela afirma que vai estar lá te esperando em frente à farmácia. Para se envolver, é preciso confiar para não piorar. Para pular de paraquedas, é preciso confiar no instrutor. É questão de uma confiança que pode ser inconsciente. Há a impressão de que não se tem escolha às vezes, porque se você não confiar em nada, você não vive.

Mas a escolha existe. E se eu puder te dizer algo sobre o seu poder de decisão, escolho dizer para você confiar. Não em tudo, nem em todos. Mas quando puder, confie. Assim como a velhinha, assim como um agricultor que confia no tempo para as plantações não darem prejuízo, assim como uma pessoa que ama no que confia. É preciso amar para confiar. E aí, me desculpe, mas vá procurar você o significado de amor o qual eu sugiro.

- Mariana Sanches Moraes


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