Universos Infinitos
Há dois anos, estreei em uma peça de teatro
baseada no livro “O paraíso são os outros”, de Valter Hugo Mãe. Naquela época,
cada palavra soava como uma sensação verdadeira em cima do palco, a energia era
singular e a conexão entre as pessoas, elenco e público, era intensa. Mas, fora
dele, com o passar dos dias, em meio ao excesso da rotina maçante, muito da
significância da dramaturgia se esvaiu. Me vi como pessoa comum, aos meus olhos
e aos alheios, que de nada pode acrescer ao mundo. Me sentia pouco quista e
vazia, oca, como se um toc toc na porta e um toc toc na minha cabeça tivessem o
mesmo efeito sonoro. E a maturidade, virtude que só o tempo e as experiências -
principalmente as desagradáveis - nos concede, é que nos faz ver as pessoas, as
coisas, as teorias e a nós mesmos de forma diferente. É como se eu não fosse
mais eu, e nem você fosse mais você, e até a Torre Pisa parece reta. A
percepção muda, e mudar dói. Eu tive um professor que sempre dizia isso, mudar
dói. Mas é necessário e é muito bonito.
Nessa obra
de Valter Hugo Mãe, tinha uma frase interessante: “Ser tudo igual é característica do azulejo na parede e, mesmo assim, há
quem misture.” Pensando em como essa frase mudou dentro de mim com o passar
desses anos, resolvi também mudar a maneira como eu enxergo a mim e os outros.
Todas as cenas da peça possuíam uma essência que eu via, sentia, mas não
conseguia decifrar. Porque, bem na verdade, cada pessoa é um universo – e não
um azulejo. Cada passo torto, cada palavra com tom ríspido, cada sorriso
exagerado, cada eufemismo mal encaixado, cada atitude bem pensada, cada escolha
impulsiva, cada quadradinho de azulejo, seja beje e áspero ou rosa e liso, é só
seu. É particular, é único, é necessário. E isso faz de nós, juntos,
multiversos espalhados por aí, cheios de buracos negros que podem nos levar a
outras dimensões, a outros universos. Para que ler somente sobre astronomia se
há mundos do seu lado que você pode explorar agora, e que se modificam a todo
momento? Se você tiver sorte, o papo entre o seu universo e o da outra pessoa
vai ser tão bom que vocês juntos irão discutir sobre as leis da física e,
quiçá, as da química também.
É importante saber o que tem do lado de fora da janela, saber
do externo, da bolsa de valores, do índice de violência que aumentou e da taxa
de natalidade que diminuiu. Mas jamais esquecer do interior, dos pensamentos,
das lembranças, dos sentimentos, do autoconhecimento. Já pensou que chato seria
imaginar que pessoas são apenas aquilo que falam, que comem – como diz o ditado
– , que vestem e em que trabalham? Essa é a visão que Antoine de Saint-Exupéry,
em O Pequeno Príncipe, tem dos adultos, e não dá para culpar. O cara
simplesmente chegou à conclusão de que as “pessoas grandes” importam-se somente
com números – idade, salário, horas, estatísticas. É como se não fossemos mais
capaz, após atingir a maturidade, de ter um olhar curioso e otimista da vida.
Eu sei, as nossas vivências nos deixem cada vez mais frios e intolerantes. Mas
não dá para ignorar o céu azul quando ele está ali, em cima de nós. Alias, qual
foi a última vez que você olhou para o céu? Foi para contar até três e não
surtar, ou foi para contar as estrelas?
Por muitas
vezes, eu deixei o medo me privar de muita coisa, e talvez fosse importante eu
ter me permitido naquela época. Mas a derrota vem. Não adianta, uma hora ou
outra, a vida vai te fazer cair, e você vai ter que mudar de postura e se reerguer.
Prefira sofrer a nunca conhecer, prefira ver todos os lados para ter certeza de
que o triângulo não é pirâmide a simplesmente julgar de cara, prefira acreditar
a desconfiar, prefira permitir e explorar. Sempre. Seja a energia escura que
expande o seu próprio universo, as infinitas dimensões que nem a Teoria das
Cordas abrange, as equações mais indecifráveis que só você resolve. Cuide-se.
Abrace-se. Construa a sua riqueza interior, porque ela vai te levar para
lugares onde a gravidade não te derruba.
- Mariana Sanches Moraes
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